Stalker de Débora Falabella: saiba quando a perseguição na internet se torna crime
Lei sancionada em abril de 2021 tipificou prática no Código Penal, que pode acontecer no mundo físico ou virtual e é mais comum contra mulheres. Entenda o que é, quais são penas e veja como denunciar. ‘Stalking’: saiba quando a perseguição na internet se torna crime
Perseguir uma pessoa on-line ou no mundo físico pode dar cadeia. Em abril de 2021, foi sancionada uma lei que incluiu no Código Penal o crime de perseguição, conhecido também como “stalking” (em inglês).
A pena para quem for condenado é de 6 meses a 2 anos de prisão, mas pode chegar a 3 anos com agravantes, como crimes contra mulheres (entenda mais abaixo).
Neste fim de semana, a atriz Débora Falabella revelou que convive há mais de 10 anos com uma história de perseguição. Tudo começou em 2013, quando uma ainda fã entrou no mesmo elevador que a artista e pediu uma foto. Depois disso, o caso tomou um caminho um tanto quanto inconveniente.
Nos dias que seguiram, a mulher, hoje com 40 anos, enviou diversos presentes ao camarim da atriz, como uma toalha branca, objetos e uma carta com teor íntimo e invasivo.
Em 2015, a artista chegou a registrar o caso em uma delegacia pelo delito de ameaça, mas não continuou com o processo.
Veja, a seguir, o que diz a lei sobre o crime de stalking e o que dizem especialistas no assunto.
Veja como e quando denunciar o ‘stalking’, crime de perseguição
Daniel Ivanaskas/G1
O que caracteriza o crime de ‘stalking’ na internet?
O termo “stalkear” muitas vezes parece banal, utilizado para se referir a prática de bisbilhotar os posts de pessoas. A curiosidade, por si só, não configura nenhum tipo crime.
O delito ocorre quando isso passa a influenciar na vida de quem é acompanhado.
“O que caracteriza o crime é quando há uma ameaça à integridade física ou psicológica da pessoa, restringindo uma capacidade de se locomover ou perturbando a liberdade ou a privacidade do alvo”, explicou Nayara Caetano Borlina Duque, delegada da DCCIBER (Divisão de Crimes Cibernéticos da Polícia Civil de São Paulo), em entrevista ao g1, em 2021.
A lei diz que a perseguição deve ser reiterada, ou seja, acontecer diversas vezes.
Na prática, o crime de “stalking” digital se dá quando a tentativa de contatos é exagerada: o autor passa a ligar repetidas vezes, envia inúmeras mensagens, faz inúmeros comentários nas redes sociais e cria perfis falsos para driblar eventuais bloqueios.
Criminoso costuma criar perfis falsos e fazer diversas tentativas de contato
Daniel Ivanaskas/Arte G1
Crime vai além da espionagem
“Temos notícias também de malwares (programas espiões) que são encaminhados e infectam dispositivos móveis ou o computador da vítima. E, a partir dali, é possível o infrator ter um histórico de localização, chamadas, agenda de contato, quais as fotos e vídeos que fez”, disse a delegada da Divisão de Crimes Cibernéticos.
Muitas vezes, a instalação desse tipo de software, também chamado de “stalkerware”, acontece por meio de um acesso físico ao aparelho celular – ou seja, alguma pessoa da convivência da vítima pega o aparelho e baixa o programa.
Apesar disso, há casos em que os apps vêm “disfarçados” e as vítimas podem ser levadas a instalá-los em seus dispositivos sem perceber.
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‘Stalking’ (perseguição, em inglês) agora é crime no Brasil
Daniel Ivanaskas/Arte G1
Mas a prática de instalar um programa como esse no celular de alguém não é o suficiente para caracterizar o crime de “stalking”.
“O crime exige a perseguição somada com ameaça de integridade física, psicológica, perturbação da privacidade, da liberdade, restringindo a capacidade de locomoção. A vítima tem que sentir que houve violação de alguma dessas características”, explicou Nayara.
“A vítima fica com tanto medo do perseguidor que deixa de frequentar os ambientes que ela costuma ir, não vai na academia, não vai ao trabalho, não sai mais desacompanhada”, explicou em 2021 Jacqueline Valadares da Silva, então titular da 2ª Delegacia de Defesa da Mulher em São Paulo e hoje presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp).
Vítimas sentem medo de seguir a rotina por causa da perseguição
Daniel Ivanaskas/Arte G1
On-line e off-line
Segundo as autoridades ouvidas pelo g1, é comum que a perseguição ocorra no mundo virtual e no mundo físico ao mesmo tempo:
as tentativas de contato geralmente começam pela internet;
com o tempo, o autor passa a tentar encontrar com a vítima pessoalmente;
é comum tentar constrangê-la ao aparecer na porta de casa ou do trabalho.
Quando e como denunciar?
Quando uma pessoa se sentir perseguida a ponto de ter que alterar a sua rotina por medo do “stalker”, é hora de procurar a polícia, dizem os especialistas.
“É tentar fazer esse exercício: entender qual o momento que isso se torna incômodo. Quando a tentativa de contato fica abusiva demais e você não pode usar o seu telefone”, disse Bruna Santos, coordenadora da ONG Data Privacy Brasil.
A pessoa que sofre esse tipo de perseguição deve procurar a delegacia mais próxima ou a delegacia eletrônica para fazer o registro do boletim de ocorrência.
Não é preciso conhecer o “stalker” para fazer a denúncia. Em muitos casos on-line, os perseguidores utilizam perfis falsos para enviar mensagens – e a polícia pode pedir para as empresas de mídias sociais compartilharem informações sobre o dono daquela conta.
Para que a polícia possa dar prosseguimento à investigação, a vítima precisa fazer uma representação, que é dizer às autoridades que deseja que o agressor seja processado.
“Por ser um crime que afeta diretamente a vida privada da vítima, a esfera de privacidade dela, a lei trouxe esse requisito. Isso pode ser feito num prazo de 6 meses a partir do momento que a gente sabe quem é o autor daquele crime”, explicou a delegada Jacqueline Valadares da Silva.
“Caso contrário, a polícia não pode instaurar inquérito, não vai poder haver um processo criminal contra esse agressor”, concluiu.
É preciso juntar provas?
Não é preciso apresentar provas na hora do registro da ocorrência, mas a recomendação é reunir evidências da perseguição. “Se vir que apareceu no celular que está havendo um acesso externo, tentar tirar uma captura de tela, por exemplo”, disse Bruna Santos, coordenadora da Data Privacy Brasil.
“O simples print não garante a autenticidade e a veracidade da prova. O STJ considerou essa questão da prova que pode ser modificada, adulterada”, advertiu a professora de direito penal da Pontifícia Universidade Católica (PUC) Campinas, Christiany Pegorari Conte.
A advogada explicou que as vítimas de crimes na internet podem realizar a captura de tela, mas o ideal é buscar meios que ajudem a comprovar a autenticidade das informações.
Uma das possibilidades é registrar uma ata notarial, método em que um cartório pode reconhecer que um conteúdo realmente estava em um app ou página da internet em uma determinada data. No entanto, esta opção não garante que não houve adulteração na conversa.
Outra possibilidade é buscar empresas que prestam serviços de registro de provas digitais. Esse método oferece mais garantias de que uma informação não foi adulterada.
Bruna Santos, da Data Privacy Brasil, disse que um advogado pode ajudar nesses casos. Ela destacou que há alternativas gratuitas como a Rede Feminista de Juristas e a Defensoria Pública para buscar orientação jurídica.
‘Stalking’ contra mulher
A delegada da Delegacia de Defesa da Mulher de São Paulo explicou que o agravante relacionado ao crime “contra mulher por razões da condição do sexo feminino” traz duas hipóteses:
Quando o crime for praticado no contexto da violência doméstica e familiar, o que remete à Lei Maria da Penha. Nesses casos, o agressor possui uma relação íntima de afeto, uma relação familiar ou uma relação doméstica com a vítima.
Quando a conduta for praticada por menosprezo ou discriminação pela condição da mulher, o que inclui agressores que nunca tenham tido contato com a vítima.
Mesmo antes de o “stalking” virar crime no Brasil, a ONG Safernet já vinha mapeando vítimas e ofereceu um canal de ajuda. De 2015 e 2020, foram 87 casos de vítimas de “ciberstalking” que buscaram ajuda da SaferNet.
A ONG diz que as mulheres eram maioria nos atendimentos (75,9%). Segundo as delegadas ouvidas pelo g1, é mais comum que o crime seja cometido por parceiros ou ex-parceiros das vítimas.
Mulheres são maioria das vítimas de perseguição
Daniel Ivanaskas/Arte G1
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