Paula Santoro lapida o ouro de Minas Gerais em show feito com técnica e o toque fino do pianista Rafael Vernet
Resenha de show
Título: Paula Santoro – Duo com Rafael Vernet
Artistas: Paula Santoro e Rafael Vernet
Local: Dolores Club (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 13 de junho de 2024
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ Mineira de Belo Horizonte (MG) que reside na cidade do Rio de Janeiro (RJ), Paula Santoro é cantora que personifica a perfeição da técnica vocal.
O dom de sempre alcançar as notas certas ficou evidente desde que a artista pisou no palco da casa carioca Dolores Club na noite de quinta-feira, 13 de junho, e começou a cantar Travessia (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1967), dando início a show feito em duo com o pianista, arranjador e produtor musical Rafael Vernet, habitual parceiro da artista nos estúdios e nos palcos.
O mote do roteiro do show foi um tributo aos compositores mineiros que se aglutinaram ao longo dos anos 1960 e –sob a liderança de Milton Nascimento – deram forma ao Clube da Esquina, movimento pop mineiro que abriu portas e mundos na música brasileira a partir do início da década de 1970.
Cantora que traz esse sofisticado cancioneiro entranhado na alma musical, além de ser preparadora vocal e exímia conhecedora das harmonias intrincadas da turma mineira, Paula Santoro mostrou intimidade com temas como a Canção do sal (Milton Nascimento, 1965).
“Eu ouço esses compositores desde que me entendo por gente”, ressaltou Santoro ao cumprimentar a plateia após o canto de Beijo partido (Toninho Horta, 1975), música na qual a intérprete esboçou dramaticidade.
Tecnicamente, o show transcorreu perfeito, evidenciando a total sintonia entre a cantora e o pianista em números como San Vicente (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1972).
Quando Paula permitiu a conexão da técnica vocal com a alma da intérprete, como na libertária canção Manuel, o audaz (Toninho Horta e Fernando Brant, 1980), ouvida em registro que ombreou a gravação referencial de Jane Duboc, o show cresceu, atingindo o ápice no bis, com a lembrança de Não é céu (1996), canção do gaúcho Vitor Ramil gravada por Santoro em álbum de 2005.
Paula Santoro canta músicas como ‘Cruzada’ e ‘Nascente’ no Dolores Club, no Rio de Janeiro, em show com pianista Rafael Vernet
Aloizio Jordão / Produção Paula Santoro
Sim, Paula Santoro se permitiu eventualmente extrapolar as montanhas mineiras para cruzar mares também profundos como o do compositor fluminense Fred Martins, de quem reviveu Guanabara (2009).
Em Outubro (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1967), cantora e pianista se entrosaram em atmosfera densa que evidenciou a força desse lamento do primeiro álbum de Milton Nascimento, um avatar, entidade que deu luz divina ao Clube da Esquina, como Santoro sublinhou em fala do show.
Se Santoro explorou regiões agudas da voz em Nascente (Flávio Venturini e Murilo Antunes, 1978), a cantora e o pianista se afinaram em Consolação (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966) em número que desembocou no jazz.
Já o canto de E daí? (Milton Nascimento e Ruy Guerra, 1978) transitou no caminho da intensidade com a intérprete expondo nos olhos o “brilho de 30 velas” em contraponto para a delicadeza posterior que envolveu Ponta de areia (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1974), ponto luminoso do show.
Também leve, O trem azul (Lô Borges e Ronaldo Bastos) seguiu no trilho da cumplicidade da cantora com a plateia, cujo coro na canção – incentivado e regido por Paula Santoro – dominou o número.
Em contrapartida, a técnica vocal voltou a imperar no canto de Léo (Milton Nascimento e Chico Buarque, 1978), tipo de música talhada para cantoras que dominam a pauta, como Paula Santoro, também capaz de enfrentar a difícil Cruzada (Tavinho Moura e Marcio Borges, 1978) com a habitual segurança.
No fim do show, antes do apoteótico bis, quando Paula Santoro percutiu um tambor de Minas enquanto entoava Coisa mais maior de grande (Gonzaguinha, 1981), ficou a certeza de que a voz dessa excelente cantora mineira merece ecoar por aí, mostrando riquezas da música brasileira, sobretudo o ouro de Minas Gerais, e de outros estados desse país musicalmente maior de grande.
Paula Santoro expõe a perfeita técnica vocal em show feito no Dolores Club, no Rio de Janeiro (RJ), em 13 de junho
Aloizio Jordão / Produção Paula Santoro